quinta-feira, 27 de novembro de 2008

imagens do pensamento

Chovem côdeas na paixão
nascem figos no tomilho
ouço vozes no convés.

Abate-se uma traineira
no grelo da tradição

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Diário de bordo

Resolvi criar mais este item no blog.
Um item que não exija de mim uma preparação prévia, onde me permita soltar-me e seguir o fluir do pensamento,
onde me exponha numa outra dimensão,
é este que enceto agora,
o diário de bordo.
De momento a minha vida divide-se entre as minhas duas cidades
embora só uma seja realmente e verdadeiramente a minha: Tavira!
O meu ser,
o meu sentir,
o meu cheirar,
a minha musicalidade...
a minha aprendizagem do mundo e da sua valorização foi feita aqui
em Tavira
e através desta cidade, das suas manchas cromáticas, dos seus volumes, dos arredores, dos seus ventos e águas... das suas temperaturas... das suas gentes, enfim....
se me começaram a despontar os humores
e a classificar os sabores.
A outra,
é aquela onde nasci, Lisboa,
aquela que nunca quis conhecer, nem quando para lá fui e lpor á andei a vender cursos de porta em porta,
(não vendi grande coisa porque não estava muito convencida do que queriam que eu convencesse os outros a comprar...)
nem quando lá renasci,
no Ar-Co,
escola que frequento agora de novo, após vinte e um anos de ausência.
Essa coisa de ter nascido fora da minha terra sempre me deu que fazer por dentro.
Sempre achei que Lisboa me tinha roubado qualquer coisa por me ter visto nascer.
Arrancou-me à plenitude das minhas raízes e eu fiquei muito zangada.
E não me tornei menos provinciana lá por causa disso, palpita-me que bem antes pelo contrário,
sinto uma mistura profunda com o horizonte natural destas bandas.
Com o urbano nem por isso.
A Eulália marcou o meu destino com as histórias que me contava na minha infância, quando eu estava doente ou, muito simplesmente, quando ela precisava de fazer qualquer coisa, e por isso era imperioso que eu me mantivesse pelo menos quieta.
Ela conseguia prender minimamente a minha atenção com aquela coisa da Maria dos Reis, a lavadeira que levava os meninos que não comiam a sopa toda ou que se portavam mal.
Antes de me mostrarem na rua a Maria dos Reis de saco às costas, pois eu ainda ía construindo uma imagem de uma criatura humana capaz de levar tanto menino dentro do saco, mas quando a vi, ri-me logo toda por dentro e pensei cá com os meus botões que elas deviam achar mas é que eu era tansa. Como se eu não tivesse já sentido prático e noção do que é plausível de ser verdadeiro ou falso.
Então, pois se andavam sempre a chagar-me a mioleira porque eu marinhava às árvores, corria pelos telhados, queria apalpar as coisas e misturar-me com o mundo...
Quem corre e finta e salta, tem que avaliar os balanços do corpo, medir a força dos músculos... eu competia também com rapazes nestas brincadeiras necessárias a encontrarmo-nos com a matéria que nos rodeia e com aquela que nos enforma...
Com certeza que quando me disseram que aquela senhora meio magra com ar triste, não de má, que vergava uma quase corcunda de fazer as costas aos sacos... eu pensei: Coitados, não vêem que isso não tem jeito nenhum!? Então não se vê logo que o mundo não pode ser assim?
Às vezes ia para a contra loja das minhas tias e escondia-me dentro dos caixotes de papelão.
Ai!? Precisava de respirar fundo de tanto disparate que me envolvia. Depois andava tudo à minha procura e eu ficava ali encolhida a pensar: Já está! Já estou outra vez metida numa embrulhada!?
Ah! A Eulália tinha também aquela da Mulher das Orelhas Grandes que estava escondida na casinha do tanque. Está bem!
Não acreditava lá muito mas o que é certo é que a Mulher das Orelhas Grandes de algum modo marcou a minha infância pois houve fazes em que já adulta sonhei muito com a casinha do tanque, com uma espécie de elefante do tamanho da minha tia Júlia mas gordo como um elefante, de pé, no meio da casinha, com um ar de estátua imperturbável mas que no seu interior continha uma vida com tiques de perversão e olhava com ironia por dentro de um outro olhar que pareciam bocados de vidro que fazem de conta que vêem.
E esse elefante baixo, sem dentes mas com tromba, estava ali, prostrado, no centro, contornado por um lago redondo que circundava a ilha onde o elefante permanecia, cheio de cobras pequenas, muito coloridas, muito cheias de intensidades fosforescentes nos seus corpos longos e finos ou curtos e finos, muitas, diferentes, rabeando por todo o lago, impregnadas de venenos dispares e intensos.
Toda a luz existente na casinha do tanque, nesses sonhos, provinha daí, desse lago entre dois círculos... o que dava ao (à) elefante um ar ainda mais ridiculamente pérfido.
Mas, na vida real da minha infância, eu também não ia lá muito nessa coisa da Mulher das Orelhas Grandes. Achava que já que ela insistia tanto, até que podia ser que realmente existisse uma mulher de orelhas grandes escondida na casa do tanque pronta a fazer mal a qualquer criatura inocente que passasse. Isso para mim, mesmo em pequenina, não fazia sentido nenhum.
Quando embalava mais na cantiga da Mulher das Orelhas Grandes era quando seguia as suas descrições, fazia uma espécie de visualização (a gente sempre fez coisas destas, das maneiras mais caseiras possíveis, só que não lhes dávamos nome nenhum, nem pensávamos nisso, né? Agora é que a consciência dos processos vem a chamar a essas coisas de "visualizações" e são-no na realidade e podem ser conduzidas de milhentas maneiras). Ficava em transe, pois claro, e aí a gente embarca em muita coisa...
Mas a Eulália um dia descobriu o Tarzan!
Contou-me uma história do Tarzan e eu nunca mais quis outra coisa! Tarzan é que era!
Aí, aderi perfeitamente à personagem e depois comecei a ler bandas desenhadas do Tarzan e depois também romances... e depois... colei-me ao bom selvagem solitário cheio de valores.
Esse, toda a gente sabe que era inventado, eu também sabia que o Tarzan tinha nascido da cabeça de um homem. Pois, mas esse que me disseram que era inventado, eu cá achava-o até muito real.
E foi assim que a Eulália, sem crer, marcou definitivamente o meu destino porque me abriu uma porta, tipo luva, para eu encaixar uma directriz estrutural para o olhar.
A Ilha de Tavira fez o resto.
É interssante que estas imagens me venham à cabeça exactamente na altura em que resolvo conciliar-me com Lisboa, em que me disponho a conhecê-la e a re-partir para a minha vida também dentro dela.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Fotografia - Reflexos e Pintura 1

Aqui está outro registo fotográfico de reflexos de barcos de pesca na ria, na Fuseta.

É por estas e outras que eu costumo dizer que ando à procura das pinturas do Criador. As pinturas que já estão dentro das coisas, do mundo real que nos circunda, tão cheio de histórias e lendas escondidas por contar.


Tenho outras que são autênticos quadradinhos de banda desenhada, mas interessa-me mais mostrar a plasticidade da realidade não apenas nos reflexos mas na forma como estes podem estar instalados na realidade, como podem já estar enquadrados "à maneira" nos bocados da realidade onde a gente pousa o olhar.

Ou como esta foto que se segue, que me suscita de imediato mil histórias para desenvolver e onde ao mesmo tempo se pode ver o que o toque da evidencia do real, encarnado naquela tira de lancil, pode implicar na composição.

Fotografia - Reflexos e Pintura

Sinto que as minhas buscas com a máquina fotográfica me conduzem à pintura.
Nos reflexos torna-se muito evidente essa minha tendência para a pintura.
O olhar pictórico.
Aconteceu-me encontrar este reflexo no Sécua, foi registado do lado de lá da ponte (na zona das esplanadas à beira rio, a seguir ao arco, perto da Ponte Romana).
A rua de onde se vê nascer a luz, sobe em direcção às traseiras do Palácio da Galeria.
De algum modo parece uma pintura, mas não é, é um registo fotográfico.

Um registo fotográfico que pode ser reenquadrado:


Pode ser reenquadrado de várias maneiras, dando destaque a partes diferentes do mesmo registo.


Posso querer explorar apenas a luz de permeio quase de um diálogo.


Ou procurar, a partir da luz, um ténue princípio de um rosto.






E estes registos podem apenas iniciar projectos de pintura que evoluem posteriormente para outros caminhos.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Prosa poética

Quando o sol abriu o primeiro olhar sobre o mundo já eu te amava em canduras e deleites infantis. Há em ti um flanco intocado. Um lugar que se mantém guardado. Um mistério por revelar. E em mim, um encantamento, transportado num lamento, que tem vindo a vagar o tempo, magoado de tanto esperar.

Amo-te, pousada nas brumas da outra margem das coisas. Construo coroas de sorrisos floridos. Ainda há um romance por inventar.
Molho os pés nus nas águas de uma nova força por desatar. E brinco, distraída, nas chuvas dos passos que abrem o teu rosto, envergonhado, das formas refeitas onde se anuncia o nascer do sol e o luar.
Quem és tu cavaleiro de amplos gestos? Porque trazes tanta espada loura escondida nas dunas do teu olhar? Onde guardaste a raiz da tua candura? Quero ir à tua procura. Deixa-me perder-me no odor das tuas primaveras já desventradas. Solver os despojos da semente perdida daquela flor mesclada ainda por despontar.
Amo-te como quem ferve. Visto-me de pássaros de muitas cores e abeiro-me das nuvens por onde escapam os teus sonhos em sachos de rebuçado. Porque escondes os teus mistérios e os penduras lá no céu onde só transformada em asa branca consigo chegar? Porque guardas tanto pranto nas conchas dessas mãos com que me debulhas receoso de te revelar?

Lembras-te da manhã em que o sol acendeu o dia diante do nosso olhar? Depois pousou-se nos montes, abriu os braços e correu para nós. Veio dizer-nos que gosta de nos ver brincar.
Nessa noite havia-me esquecido do medo bebendo mel da tua força. Passeei pelos planaltos do teu corpo com o andar distraído de quem se perde em cada recanto. O tempo não existe quando o agora se transforma em pérola cheia de magias por navegar.
Os teus lábios vistos de cima, e aquietados em sorriso meigo alagam-me a alma. O teu olhar cheira a linho e o teu corpo goteja o assomar de uma paixão. Gosto de repousar nas tuas reentrâncias e lanço os lábios em aventuras de veludo nos montes fofos do teu peito, cortado por um ribeiro onde os peixinhos gostam de me contar contos de encantar. Os teus ombros são planícies serenas onde o meu rosto se estende para sentir melhor os teus malabarismos raros. As pontas dos teus dedos são rebentos de beijos encadeados e abrem-me caminhos cheios de sensações que estavam por rebentar. Os corpos misturam-se em dança. Alvoraçam-se os corações em tango e fado. Beijo-te como quem voa e ultrapassa o limite. E amo-te nas espumas breves que se soltam do chilrear dos pássaros matinais.
Beijas-me como quem embala uma criança há muito guardada dentro do peito e que agora quer brincar. Beijamo-nos com encantamento e deleite. Entretidos, embevecidos, estendendo o tempo, entregues ao que está a acontecer com a naturalidade de quem faz aquilo que sempre fez, porque nasceu para o fazer.
Escrito em 2006

Jornalismo - Entrevista com Henrique Gabriel

in Postal do Algarve - Julho de 2008
“Os paraísos perdidos estão somente em nós mesmos”.
Marcel Proust

Cada obra surge como um fragmento de uma busca da resposta possível.
Cada tela é a revelação de uma parte de mim
Uma viagem a Santiago revolucionou a sua vida

Henrique Gabriel nasceu no Concelho de Arganil, em Vila Cova de Alva. Comecei por lhe perguntar quando descobriu que tem alma de artista. Respondeu que “se ter alma de artista é sentir o mundo como uma pergunta que procura uma resposta, uma busca do sentido da existência, uma procura por algo que adivinhamos estar em algum lugar e ser fundamental para o entendimento do Todo, então diria que é algo que nunca me foi estranho. Acredito no entanto que de alguma forma não é privilégio, ou fado, de apenas alguns eleitos mas algo inerente à condição humana. O que talvez faça a diferença é ser-se mais ou menos inconformista, é o aceitarmos ou não o visível e aparente como real e imutável e as ansiedades da vida como algo sem redenção. É no assumir dessa demanda, desse estado de espírito que surge a necessidade de exteriorizarmos os vazios e empreendermos a caminhada, aí surge o artista e cada obra surge como um fragmento de uma busca da resposta possível.
Talvez que cada obra seja como a peça de um puzzle e no seu conjunto a resposta que o artista procura, o seu Graal, a sua Pedra Filosofal
”.

Foram 20 anos a trabalhar como criativo gráfico

Em 1977 frequentou o Curso das Artes Plásticas da ARCA em Coimbra mas acabou por enveredar pelas Artes Gráficas mas desde pequeno o seu sonho era ser pintor. “Nasci numa pequena aldeia beirã. Os meus pais tinham um pequeno comércio. Muito pequeno tive acesso ao lápis e ao papel pardo que fazia parte integrante do balcão da mercearia. Foi o meu primeiro estirador, o meu primeiro cavalete, subia acima de um banco e desenhava. Ao contrário da maior parte dos meus colegas de escola primária os meus pais puderam proporcionar-me a continuação dos estudos. Quando chegou a altura de optar por um curso superior, como era hábito na época, quem desenhava optava por arquitectura mas sinceramente nunca senti que fosse curso para mim. Acabei por (na altura achei que era uma pausa) começar a trabalhar numa gráfica em Coimbra. Foi a minha grande escola profissional. Quando por volta dos 21 anos vim para Lisboa”, onde frequentou o Curso de Design Gráfico na ARCO, “os meus conhecimentos técnicos de artes gráficas aliados ao facto de sempre ter continuado a desenhar abriram-me as portas das agências de publicidade. Foram 20 anos a trabalhar como criativo gráfico até ter a minha própria agência. Em 1997, tirei um mês de férias e fui percorrer a pé o Caminho de Santiago de St. Jean Pied-Port a Santiago de Compostela. Quando regressei, deixei a publicidade e assumi a pintura como ocupação a tempo inteiro.

Percorrer o Caminho de Santiago foi o culminar de uma etapa dessa busca

Esta viagem revolucionou a sua vida e devolveu-o aos sonhos de tenra idade. “Há quem defenda que o Caminho de Santiago existia muito antes do Cristianismo. Para os druidas, que acreditavam na reencarnação, terá sido um caminho de limpeza cármica. Terminava em Finisterra, à beira-mar onde tomavam um banho de purificação e assistiam ao pôr-do-sol, a morte do Sol, que no dia seguinte surge de novo, brilhante de vida, para mais uma etapa de morte e renascimento. Fulcanelli fala do Caminho de Santiago (em sentido figurado ou não) como fundamental para o alquimista na concretização da Grande Obra. A história do caminho é para mim a história de cada um que ao longo dos tempos o percorreu. Assim sendo só posso falar da minha experiência. Desde sempre dediquei grande parte do meu tempo à leitura de temas que versam a espiritualidade nas mais variadas vertentes e percorrer o Caminho de Santiago foi o culminar de uma etapa dessa busca. No primeiro dia de caminhada, no cimo dos Pirinéus, encontrei o primeiro de muitos peregrinos com quem me cruzei. Era um gigante da Corunha, Santiago Navarro, figura imponente do alto dos seus 63 anos e das suas barbas brancas, para quem o caminho já não era desconhecido. Dois dias depois juntou-se a nós um brasileiro Jaime Sprícigo e caminhámos juntos bastantes dias criando um forte laço de fraternidade. Um dia enquanto o Santiago dormia, sentei-me ao seu lado e desenhei-lhe um retrato. Ficou tão contente com aquele pequeno presente, que nos dias que se seguiram mostrou-o a todos com quem nos cruzávamos. Quando regressei a casa, comprei material e pintei-lhe uma tela que hoje está em casa dele na Corunha. Foi a minha primeira tela, continuei a pintar e em 2000 optei pela pintura a tempo inteiro. Tudo o resto já não me fazia sentido”.
Participou de várias exposições colectivas e individuais em vários pontos do país, em Espanha, e Estados Unidos da América. “Fiz a minha primeira exposição sobre o Caminho de Santiago em 2001, é um tema inesgotável e de várias formas o Caminho também se manifesta assiduamente como que me indicando que estou no caminho certo. Dou um exemplo, meia hora antes de inaugurar esta exposição no Convento de S.José, estava a passear num jardim próximo e de repente sou surpreendido por uma personagem sentada num banco do jardim. Compridas barbas brancas, pelo peito, cajado com uma cabaça pendurada e vieira ao peito. Um peregrino de Santiago, ali mesmo no Centro de Lagoa. Trocámos histórias, convidei-o a ir à inauguração. Concedeu-me o privilégio da sua visita, brindámos o Caminho com um vinho do Porto e despedimo-nos com um abraço a tratarmo-nos por irmãos. Já percorri vários Caminhos para Santiago e dei algumas palestras sobre o tema, frequentemente perguntam-me quantas vezes fiz o Caminho, respondo que o Caminho de Santiago não se faz, inicia-se. Aprende-se uma forma de viver, de comunicar, de estar com os outros e de estar com nós mesmos. Em Setembro próximo, após 11 anos vou-me reencontrar com o Santi e com o Jaime e percorrer o Caminho de Salamanca a Finisterra. Estas amizades são para a vida”.

Para mim pintar é uma forma de meditação

Para Henrique Gabrielpintar é uma forma de meditação. Nunca faço esboços as imagens acontecem quando crio o espaço para essa manifestação. Um espaço de abstracção, é uma caminhada para outros lugares, outras formas. Sinto cada quadro como um vislumbre de um outro mundo que existe em algum lugar do meu imaginário e que só através da pintura me é acessível. Cada tela é a revelação de uma parte de mim onde racionalmente não consigo chegar”.
Para mais informações sobre o artista pode consultar http://www.hgabriel.com/.

Paula Ferro

jornalismo - Entrevista com Vitor Picanço

in Postal do Algarve - Junho de 2006


Nós somos um somatório de emoções




Vítor Picanço é natural de Tavira e licenciado em Escultura pelas Belas Artes de Lisboa. Tirou o curso trabalhando em Arquitectura, Urbanismo, Topografia e dando explicações de Geometria Descritiva. Foi bolseiro da Gulbenkian. Leccionou Educação Visual, Geometria Descritiva e Oficina de Artes durante 28 anos em várias escolas e paralelamente sempre se dedicou à Escultura. Não trabalha, vive, porque tem prazer no que faz.
Podem ser vistos trabalhos seus na Galeria da Restauração em Olhão até dia 14 do corrente mês.

Com que idade descobriu que tinha tendência para a arte?
A tendência para a arte descobri no primeiro ano do liceu. Na escola primária houve uma passagem em que me mandaram desenhar um copo com água. As professoras ficaram encantadas porque se via a transparência no vidro. Mas aquilo não me disse nada. Depois no 1ºano do liceu, o professor de desenho começou a falar da qualidade dos meus trabalhos, a compará-los com os trabalhos dos outros, a pedir-me às vezes para fazer determinadas coisas e eu comecei a notar que havia uma tendência para as artes em mim. A pouco e pouco essa tendência foi-se intensificando. Quando cheguei ao 5ºano, o meu irmão Pedro Mestre foi para Arquitectura e comecei a pensar em também ir para Arquitectura. Fiz o 5ºano cortado a História. Nessa altura a alínea adequada para ir para Arquitectura tinha História e não me pude matricular nessa alínea. Matriculei-me na alínea F que dava acesso a diferentes cursos de Ciências. Como era bom aluno a matemática, a minha mãe sugeria-me seguir engenharia. Cheguei ao 7ºano e pensei que levar a vida inteira sentado à secretária a fazer contas não era para mim. Deixei de estudar e trabalhei com o engenheiro Fernando Mendonça durante algum tempo. A certa altura surgiu um concurso para desenhar planos de urbanização na Direcção Geral dos Serviços de Urbanização. Concorri e colocaram-me na cidade da Guarda. Três anos mais tarde saiu um decreto-lei que permitia seguir mesmo com deficiência a História. Pedi a transferência para Lisboa. Fiz o exame de admissão e fiquei aprovado. Matriculei-me nas cadeiras comuns às Artes Plásticas e Arquitectura. Como já tinha o bichinho da Escultura inscrevi-me também em Iniciação à Escultura onde constatei que a minha vocação era mesmo a Escultura e pus de parte a Arquitectura.
Também se sente atraído pela Pintura?
Gosto de Pintura, tenho lá umas tintas e umas telas e ando há bastante tempo a desejar, não é a querer (fez uma paragem sorrindo), a desejar fazer umas pinturazinhas mas a Escultura tem um apelo mais forte e a Pintura vai ficando de parte.

Escolheu a pedra.
A pedra sempre. Gosto imenso da luta com a pedra.
Que pedras usa?
Qualquer uma. Desde os calcários vulgares à brecha, o mármore, o granito, o xisto…

O xisto é fácil de trabalhar?
Aparentemente. Falha muito e para além de falhar, faz um pó muito fininho. A rebarbadora às vezes prende, embaça e dá uns esticões fortes. Os meus dedos mostram aqui uns golpezinhos da rebarbadora. (Sorrisos) São ossos do ofício!

O granito é difícil?
Sim. Só com discos de diamante é que lá se chega.

O mármore?
O mármore já é mais fácil, menos o puro. O mármore mais puro tem uma espécie de cristais e falha com facilidade, tem que se ter muito cuidado. É muito delicado.

O que utiliza para trabalhar a pedra?
A rebarbadora. O escopo e o ponteiro para determinadas posições onde a rebarbadora não chega. A grosa e a lixa. À mão e com a lixadeira. A catrabucha a que chamam boneca para polir usando o chamado sabão de polir.

Que caminhos segue para criar?
Há situações em que a pedra me sugere as formas do trabalho. Por vezes sinto necessidade de introduzir outras pedras tirando partido da composição das cores e das texturas. Noutras ocasiões também com materiais diferentes (metais, madeira, acrílico, etc). O outro caminho é imaginar a forma e depois procurar as pedras adequadas àquilo que se pretende. A luta é igual. (Abre um sorriso brilhante) O gozo é o mesmo. Levo é muito tempo à procura das pedras. Há a pesquisa. Às vezes não é a forma da pedra, é a textura, ou são as cores… Há quem me pergunte porque é que numa exposição não faço tudo numa só linha. Não, nós não comemos peixe todos os dias (sorrisos). Eu gosto de variar. Às vezes faço vários trabalhos do mesmo género mas a seguir apetece-me fazer outros. A maior parte das vezes tenho em mão vários trabalhos. Um dia apetece-me trabalhar num, outro dia trabalhar noutro. Não é pegar num e ir de seguida até ao fim. É conforme me apetece! Eu quero viver e viver é fazer aquilo que dá prazer fazer. Cito sempre o Professor Agostinho da Silva. Ele diz que o Homem não nasceu para trabalhar, nasceu para viver. Quando se faz aquilo de que se gosta, vive-se. Quando se faz uma coisa de que não se gosta trabalha-se.

Quando dá aulas gosta?
Adoro! Reformei-me e estive dois ou três anos a dar apoio aos meus colegas o que me deu muito gosto.
Dava Educação Visual e Geometria Descritiva?
Sim, e Oficina de Artes: Pintura, Escultura, Arquitectura e Design.
Bolseiro da Gulbenkian.
Tive média de 15 no exame de saída no 4º ano e isso permitiu-me obter uma bolsa da Gulbenkian.
E compor?
As linhas de composição são as linhas que nós fazemos quando estamos a compor, quando estamos a criar as formas. As linhas de força são linhas que não existem mas nós sentimos e todas elas fazem parte da estrutura do trabalho.
Existe também o equilíbrio e o peso.
Claro, esse peso é um peso visual. É muito importante também pensar na iluminação das formas.

A composição é fundamental.
Claro que é. Na Escultura não são só as linhas. São as cores, as texturas, as formas, os relevos…

O que é para si ser artista?
O que é ser artista? (Recostou-se na cadeira sorrindo. Olhou-me com o verde do seu olhar todo iluminado.) Olha, vou responder-te com quadras do António Aleixo: “Ser artista é ser alguém./Que bonito é ser artista. /Ver as coisas mais além/do que alcança a nossa vista. /Arte é dom de quem cria. /Portanto não é artista /aquele que só copia /as coisas que tem à vista. /A arte é uma força imanente./ Não se ensina, não se aprende. /Não se compra, não se vende./ Nasce e morre com a gente.” Ele define perfeitamente o que é um artista e o que é a arte.
O artista vai mais além.
Esse é o artista porque o outro que faz as coisas muito bem feitinhas é o artífice, não é o artista porque não cria. Não compõe, não vai além daquilo que se vê. É o artífice. Executar é uma coisa, criar é outra.

É necessário saber executar para criar?
A parte principal é a criação. Por exemplo, um indivíduo que faz música e faz bem, embora se fale pouco dele nesse campo, é o professor Moniz Pereira, o treinador de atletismo. Ele é um fraco executante mas é um bom criador.

A técnica não é fundamental?
É evidente que é! Mas, por exemplo no futebol, os treinadores sabem como é que se faz mas nem sempre sabem fazer. O Mourinho que é considerado o melhor do mundo, (olhando para mim com um imenso sorriso, divertido com a minha admiração) foi fraco jogador. Foi um fraco executante mas é um bom criador de jogadas.
Ser bom executante não é importante para o acto de criar?
É que criar é conceber mentalmente e depois executar é transmitir através dos materiais que se usa, aquilo que se concebeu. O bom não é o perfeitinho. É o equilíbrio entre todos os elementos que se utiliza para fazer os trabalhos. É a impressão estética. Nós temos cinco tipos de emoções. Temos uma impressão de um perfume que é bom. O que é que quer dizer aquele cheiro? Nada. Nós temos uma emoção. Agradável ou desagradável. A música, com os sons. A visual, a gustativa, o olfacto e o tacto. Nós somos um somatório de emoções.


Texto e foto de Paula Ferro

terça-feira, 16 de setembro de 2008

domingo, 14 de setembro de 2008

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

A Ponte e o Vaticano

Em Março passado, foi-nos cedido um armazém na Quinta do Rosal, Sítio de S. Pedro, rente à EN 125, à saída de Tavira, no sentido de Faro, com o objectivo de aí criarmos a nossa sede.
Podemos utilizar também o espaço exterior que circunda o armazém.

A primeira reunião que aconteceu na nossa sede, na altura ainda sem nome, foi no dia 15 de Abril.

Como já fazia bom tempo, começámos no exterior. Com o que tínhamos por perto criámos uma espécie de sala de reuniões para o instante.
Colin Howe (Malik), Leif Lonne, Mathijs Warner e Ola Andresen (de costas).



Ola Andresen (em cima) que partilhava, na altura, a presidência com Isabel Macieira (Bli), em baixo.



A reunião alongou-se, o dia extinguiu-se e o frio começou a chegar. Resolvemos continuar dentro da sede. Aqui já nos encontramos no interior.




Linda Brubacher e Colin Howe (Malik)




Matthijs Warner (elemento da Direcção)







Malik, Ola, Alberto Corvo e Margarida Santos













Isabel Macieira e Matthijs Warner




Depois começaram as limpezas e os arranjos na nossa sede. O pessoal pôs mãos à obra.




Alguns momentos dessa fase:


Colin Howe (Malik)



Linda Brubacher



Casey Clark


E, lentamente, tudo foi ganhando um outro ar de começo.
Para mais informações sobre A Ponte, clique em

domingo, 7 de setembro de 2008

Fotografia - imagens com chuva 1

Registos de Outubro de 2006.




A chuva sempre me atraiu. Aliás, a água atrai-me.
Houve uma altura da minha vida em que a chuva me chamava, sempre que a chuva batia na janela, ouvia-a, não resistia e ia ter com ela para a rua.
Não uso guarda-chuva. Não gosto. Atrapalha-me. Não sei lá muito bem o que hei-de fazer com aquele objecto estranho.
Um dia comecei a reparar que a chuva nos vidros dá outros contornos aos objectos que estão do outro lado das janelas, e que, sobretudo nos dá outra dimensão, outra imagem deles. apresenta-nos nesses mesmos objectos, outro tipo de atractivos.
Passei a registar também momentos deste género.
Inicialmente, era o que surgia. Depois passei a ir mesmo à procura de imagens, de motivos, experimentando, com várias intensidades de chuva, limpo o vidro do carro, deixo pousar a chuva e vou observando e registando... Nas janelas de casa, noutros locais...
a chuva ainda me chama e ainda vou ter com ela para a rua, muitas vezes. Outras, fico dentro do carro ou dentro de casa à janela e converso com ela na mesma.

impressões - registos urbanos

Outros registos urbanos.
Outra linguagem.
Setembro 2008.

Fotografia - reflexos

Registos feitos em Outubro de 2005.








Esta é uma série de registos feitos no mesmo dia, no tanque da casa de um amigo meu.
Isto é uma série, não são as únicas fotos que tenho deste tanque. Tenho uma pasta de séries deste tanque com os seus reflexos, os seus peixes, as suas plantas... e este tanque ainda não está esgotado para mim.

impressões

Registos de 2006 e 2007.





"Com janelas assim, quem precisa de ver televisão?", "com um céu assim, quem precisa de televisões?" ou seja, com um mundo tão recheado, quem precisa que lhe digam "é assim que se olha!"?
Basta abrir os olhos, rodar a cabeça , deixar que algo prenda o olhar e depois, deixar acontecer...
e ir fazendo isso por aí...
Por tudo quanto é lado há bocadinhos de realidade cheios de coisas por dizer.

impressões

Apontamentos registados em Setembro de 2008.







impressões - registos urbanos

Faro, Setembro de 2008.





impressões do dia

Impressões do dia, Domingo, 7 de Setembro de 2008.






impressões do dia

Impressões do dia, Sábado, 6 de Setembro de 2008.