domingo, 25 de outubro de 2009

Jornalismo - Entrevista reportagem com Margarida Santos

in Postal do Algarve
Abril 2008
(in "Geografias Variáveis" - Palácio da Galeria - Tavira)

“A arte, um dos grandes valores da vida, deve ensinar aos homens humildade, tolerância, sabedoria e magnanimidade”
William Sommerset Maugham






Quando quero expressar algo tenho em conta a cor escolhida

Tanto a pintura como o desenho funcionam como catarse mas de modos diferentes.
A gravura permite-me libertar-me imenso
Margarida dos Santos nasceu em Tavira em 1968. Entrou para o Ar.Co em 1991 onde estudou Pintura, Desenho e História de Arte. Seguidamente estudou Temas de Estética e Teorias de Arte Contemporânea na Sociedade Nacional de Belas Artes. Concluiu vários outros cursos e então ingressou na Faculdade de Belas Artes onde se licenciou em Artes Plásticas – Pintura em 2002.
Começou a expor em 1993 numa colectiva do Ar.Co. A partir daí participou em diversas mostras colectivas em locais como o Museu de Angra do Heroísmo nos Açores e Casa das Artes de Tavira, entre outros. Expôs individualmente na Galeria Passage em Ayamonte, Igreja de Monsaraz e Galeria Gravura em Lisboa, entre outros locais.
Em 1995 “fiz um worshop de gravura com o Mestre Bartolomeu dos Santos na Casa das Artes de Tavira. Fui explorar técnicas de gravura que já me vinham despertando curiosidade há algum tempo, mais concretamente a textura e uma série de possibilidades dos materiais. Tirar partido da plasticidade, da técnica em si. Gostei muito”. Afirma “A gravura permite-me libertar-me imenso. Existe uma grande envolvência, e essencialmente permite-me ser mais criativa. Posso usar a fotografia, colagens, aguarela… é um conjunto de experiências que vai mais ao encontro daquilo que eu pretendo transmitir.”
Trabalhar com Bartolomeu dos Santos foi bastante gratificante e enriquecedor porque “partilha connosco as suas experiências, dialoga sobre os nossos trabalhos e fá-lo com imensa abertura. Isso incentiva-nos e ajuda a que o trabalho avance”, conta Margarida dos Santos, “fala muito sobre a influência de outros artistas no nosso trabalho e sobre as técnicas mas sublinha que estas não são mais do que meios para se chegar a algo que só se atinge se nos desligarmos do tecnicismo para outra coisa maior, a procura da nossa própria essência enquanto artistas. Isso conduz-me a uma maior reflexão sobre o meu próprio trabalho”.





Quando pinto existe uma enorme inquietação e no desenho não
No ano seguinte Bartolomeu dos Santos convidou Margarida para ser sua assistente num novo Workshop e “aí explorei um pouco mais esta forma de expressão artística. Foi nessa altura que ficou definitivamente marcado em mim o gosto pela gravura.” Em 2003/04 desenvolve a técnica da gravura na Galeria Diferença em Lisboa.
A pintura e o desenho são essenciais para o seu percurso artístico mas sente-os de modos diferentes. “Quando pinto existe uma enorme inquietação e no desenho não. O desenho permite-me deambular pelo espaço que eu crio”. Independentemente de se usar o desenho ou a pintura como suporte, o fundamental é chegar à profundidade do sentir. A música é muito importante para o seu trabalho. “Quando conseguimos mergulhar nas profundezas da própria arte na busca de tesouros invisíveis, aí está aberto o caminho para a Grande Arte É aqui que entra a música, desempenhando um papel muito importante no mundo da minha pintura. Esta funciona como um fio condutor entre o eu e a arte. Permite-me entrar no espaço criado e conduzir-me a uma maior reflexão. Ao som de Rachel’s, Maria Callas, Rodrigo Leão ou do piano de Keith Jarret, entre outros, vão surgindo novas etapas de um percurso criativo”.


O desenho é fundamental, quer a nível da estruturação do trabalho quer em termos de representação plástica

A cor é inevitável tanto no desenho como na pintura. “Bem, no desenho tento simplificar os meios. Mas, a cor transmite vibrações. Provoca em mim sensações muito fortes que chegam a ser incomodativas” e dá outra direcção ao caminho da reflexão. Impõe outro tipo de opções e de percursos. “Quando quero expressar algo tenho em conta a cor escolhida. Nada é por acaso. Isso torna a pintura mais expressiva e intensa. Quando pinto, o choque comigo mesma é inevitável porque a cor mexe em coisas ocultas, talvez ao nível do inconsciente” muito embora o uso do inconsciente no trabalho final tenha que ser feito com muita consciência. “Tanto a pintura como o desenho funcionam como catarse mas de modos diferentes porque o desenho se torna mais libertador, mais tranquilo, traz-me o encontro comigo própria. A pintura e o desenho quase que são opostos embora se toquem. Um não faz sentido sem o outro, completam-se. Na maioria dos meus trabalhos existe uma fusão entre dois”.
A nível da educação do olhar, o desenho é um mestre para todas as áreas, “é a base de tudo, é fundamental, quer a nível da estruturação do trabalho quer em termos de representação plástica”. Já a pintura “é essencialmente a representação das sensações comunicadas pelo espaço circundante. Bem, ultimamente, com os trabalhos que realizei em função de ‘Geografias Variáveis’ alterarei um pouco a minha opinião sobre o desenho. Tive sensações muito fortes. Começo a aproximar muito o desenho da pintura. Não sei mesmo se o que estou a fazer em desenho não irá ultrapassar o que experimentava antes apenas com a pintura.”
O seu trabalho pretende ter um papel de intervenção. “Quando pinto pretendo abarcar as questões contemporâneas que preocupam a humanidade, nomeadamente ambiente, guerra, sexo…. Interessa-me intervir, mexer com as consciências, essencialmente fazer pensar, sensibilizar, agitar, romper com os preconceitos”.
É importante o estudo da História de Arte porque todos os artistas recebem influências. “A presença constante dos artistas alemães no meu percurso surgiu quase de forma imediata. Inicialmente, aderindo inconscientemente. Hoje percebo que é pela sua força transmitida numa expressividade quase teatral”, explica. “Percursores que vão ao encontro da minha forma de pensar a arte? Vários, Anselm Kiefer, Gerard Richter, Joseph Beuys, William Kentridge, Luc Tuymans, Kiki Smiths e outros”.
Ultimamente “tenho enveredado pelo caminho do design gráfico e ilustração sem deixar de lado as artes plásticas. Tenho vindo a fazer formação nestas áreas, nomeadamente o Workshop de ilustração no AR.CO com Daniel Lima, ‘História da Ilustração’ com Jorge Silva, e ‘Design Gráfico’ em diversas instituições”.

Tenho feito imensas descobertas, essencialmente na exploração das novas tecnologias

Colabora em Lisboa com uma agência de talentos criativos (WHO) com ilustração e Design Gráfico, “tenho feito imensas descobertas, essencialmente na exploração das novas tecnologias que afinal de contas são o futuro e também servem de suporte para o meu trabalho plástico”.
Participou durante três anos consecutivos no Concurso de Ilustração da ETIC (Escola Técnica de Imagem e Comunicação). Ilustrou o “Clube da Poetisa Morta” Adília Lopes editado na Alemanha, assim como diversas capas de livros para o GEOTA (Associação Ambientalista) entre outros projectos gráficos.
“Colaborei com o arqueólogo João Caninas no âmbito da pesquisa documental sobre património arqueológico e etnológico na linha de metro entre o Lumiar e o aeroporto de Lisboa. Neste momento participo da exposição colectiva intitulada “Geografias Variáveis” para a qual fui convidada pelo Dr. Jorge Queiroz que se encontra no Palácio da Galeria em Tavira. Preparo também uma exposição de pintura na Alemanha (Dusseldorf). Paralelamente desenvolvo uma série de projectos gráficos no âmbito de colaborações com o departamento sócio-cultural da Câmara Municipal de Tavira e em trabalhos da Associação Campo Arqueológico de Tavira”.

Paula Ferro

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