O ambiente é de todos
Temos o dever de pensar na sustentabilidade das futuras gerações
Entrevista com Laurinda Seabra
Jornalista: Paula Ferro
A sexta entrevista do ciclo “o ambiente é de todos” que o
Núcleo de Jornalismo da Associação Min-Arifa vem realizando no diariOnline do
Região Sul é com Laurinda Seabra e aborda a problemática da extracção do
petróleo no Algarve.
Laurinda Seabra nasceu em Luanda, em
1955. Na puberdade foi viver para a África do Sul onde se licenciou em
Engenharia Mecânica. Em 1975, ainda como estudante estagiária, começou a
trabalhar numa empresa petrolífera.
É Mestre em Gestão de Negócios, pela
Milpark Business School, e a sua carreira profissional foi feita dentro da
indústria petroquímica, onde ocupou diversas funções, incluindo administração.
Em 2004 Laurinda Seabra decidiu
mudar de rumo profissional e passou a ser a Directora da Empowerment Gatewey
Consulting, uma empresa de consultadoria e empreendedorismo social, registada
na Inglaterra e na África do Sul, sediada em Lagos.
Em 2012 funda uma associação, a
ASMAA (Algarve Surf and
Marine Activities Association), a que preside.
Aos 15 anos de idade Laurinda começa
por ser activista pela defesa dos direitos humanos. Devido à sua carreira
profissional compreendeu a necessidade de se proteger o ambiente e o seu
activismo estendeu-se a esta área.
“Em Julho de 2015 foram publicados na
internet, na página oficial da organização do governo responsável pela área do
petróleo e gás natural, ENMC, contratos entre o governo e empresas
petrolíferas, já realizados”, conta Laurinda Seabra, “nós analisámos os
contratos e pedimos um parecer jurídico que nos disse que os benefícios para
Portugal eram muito poucos ou quase nulos e que traziam muitos riscos”.
“Em Setembro, a ENMC publicou dois novos contratos para o
Algarve, desta vez, relativos a concessões em terra, com os nomes de Tavira e
Aljezur”, continua a presidente da ASMAA, “se estávamos preocupados com as
explorações no mar, quando percebemos que estes novos contractos vão deixar
entrar no Algarve as tecnologias de “fracking”, a situação tornou-se muito mais
seria, porque se há riscos na exploração no “offshore”, os riscos que o
processo de “fracking” traz são muito maiores e têm impactos negativos
permanentes”.
“Na Europa o “fracking” está proibido em alguns países e nos
EUA há um intenso debate cercando a exploração por “fracking” devido aos danos
já causados”, comunica a engenheira mecânica, “este tipo de extração agride
gravemente o meio ambiente por se tratar de um processo que consiste na
perfuração e injeção de fluídos químicos no solo para elevar a pressão, fazendo
com que haja fratura das rochas e a liberação do gás natural. Nos fluídos
usados existem cerca de 600 produtos tóxicos, incluindo agentes cancerígenos.
Cada poço pode ser fraturado até 18 vezes e são necessários, de 400 a 600
caminhões tanque de água, para cada operação. O fluido que é usado é deixado a
céu aberto para evaporar, tornando o ar contaminado e contribuindo para o
surgimento de chuvas ácidas” e continua, “durante o processo, as águas subterrâneas
próximas que são usadas para abastecer as cidades da região, também ficam
poluídas. Houve mais de mil casos de contaminação próximos a áreas de
perfuração já confirmados”.
No respeitante à exploração “offshore”, os danos podem ser
imensos, “quanto à indústria da pesca no Algarve, pois a pesca comercial é um
dos nossos mecanismos económicos que precisa de ser preservado e a pesca
desportiva é uma das atividades mais populares na região. Um desastre de
petróleo ou de gás no mar irá impactar diretamente nas nossas indústrias de
pesca, resultando em perdas de valiosos recursos e também a perda de muitos
postos de trabalho nesta indústria”, explica Laurinda Seabra, “a nível da indústria
do turismo do Algarve, as zonas costeiras que estão ainda imaculadas, onde
ainda está presente a vida selvagem, atrai dezenas de milhares de turistas por
ano, injetando um impulso económico para a região. O perigo de um desastre de
petróleo terá um papel negativo na decisão dos turistas para visitarem o
Algarve”.
“Sejamos nós algarvios ou tenhamos decidido viver aqui, nós
temos a responsabilidade de proteger a costa algarvia, não só para nós próprios
e para as nossas famílias mas também para todos os visitantes e turistas”,
conclui Laurinda Seabra “e temos o dever de pensar no bem-estar e na
sustentabilidade das futuras gerações”.
A entrevista com Laurinda Seabra vai acontecer no diariOnline
do Região Sul, no dia 2 de Janeiro de 2016, às 15:30 horas.
O ambiente é de todos
Temos o dever de pensar
na sustentabilidade das futuras gerações
Entrevista com Laurinda Seabra
Laurinda Seabra nasceu em Luanda, em
1955. Na puberdade foi viver para a África do Sul onde se licenciou em
Engenharia Mecânica. Em 1975, ainda como estudante estagiária, começou a
trabalhar numa empresa petrolífera.
É Mestre em Gestão de Negócios, pela
Milpark Business School, e a sua carreira profissional foi feita dentro da
indústria petroquímica, onde ocupou diversas funções, incluindo administração.
Em 2004 Laurinda Seabra decidiu
mudar de rumo profissional e passou a ser a Directora da Empowerment Gatewey
Consulting, uma empresa de consultadoria e empreendedorismo social, registada
na Inglaterra e na África do Sul, sediada em Lagos.
Em 2012 funda uma associação, a
ASMAA, a que preside.
Aos 15 anos de idade Laurinda começa
por ser ativista pela defesa dos direitos humanos. Devido à sua carreira
profissional compreendeu a necessidade de se proteger o ambiente e o seu ativismo
estendeu-se a esta área.
O que é a ASMAA, quando
nasceu e quais os seus objectivos?
ASMAA quer dizer Algarve Surf and Marine Activities Association.
Foi registada no dia 3 de Dezembro de 2012. Tem como finalidade dinamizar a
economia do Algarve usando o mar e as zonas costeiras como ferramentas de
desenvolvimento turístico.
Cabe à ASMAA promover a coesão social e os valores
democráticos, incluindo a defesa dos Direitos Humanos e das minorias, assim
como lutar contra discriminações;
Cabe-lhe promover o diálogo e a colaboração intercultural,
assim como participar na conceção e aplicação de políticas públicas, regionais
e locais, especialmente as que afetam a sustentabilidade das pequenas e médias
empresas, e cabe-lhe ainda promover o empreendedorismo responsável,
especialmente nos sectores do surf e outras atividades englobados no sector marítimo.
Cabe à ASMAA também representar as empresas de atividades de
surf e de outras atividades marítimas que lhe estão associadas e defender os
seus direitos e legítimos interesses, assim como representar e defender os
legítimos interesses dos turistas, visitantes e residentes que estão associados.
Esta associação pretende também defender o ambiente e refrear
as zonas costeiras contra o incremento desajustado e desenfreado de construções
urbanísticas.
Uma das atividades da ASMAA, neste momento, é dar a conhecer
a sua luta contra a exploração de petróleo na costa Algarvia e Oeste e
sensibilizar as pessoas para a nossa causa, desenvolver esforços no sentido de,
não só prevenir mas também impedir, a contaminação do mar e praias, assim como
impedir outros danos ambientais;
Está nos nossos objetivos desenvolver esforços no sentido de
impedir que se continue a encaminhar para o mar e zonas adjacentes, os esgotos
domésticos e de explorações agropecuárias.
A ASMAA pretende ainda
proteger os espaços verdes, pressionando as autoridades competentes a obrigar
os madeireiros, aquando do abate de árvores para a indústria da celulose, a
recolher os excedentes não aproveitados das árvores, com o exclusivo propósito
de contribuir para a diminuição de fogos florestais.
Pretendemos ainda incentivar e formar pessoas interessadas no
aproveitamento dos resíduos florestais como elemento fundamental de compostagem
por meio de trituração mecanizada.
O que aconteceu em Julho de 2015 que tornou
a situação da exploração de petróleo no Algarve mais alarmante?
Em Julho de 2015 foram publicados na
internet, na página oficial da organização do governo responsável pela área do
petróleo e gás natural, ENMC (http:/enmc.pt), contratos entre o governo e
empresas petrolíferas, já realizados. Nós analisámos os contratos e pedimos um
parecer jurídico que nos disse que os benefícios para Portugal eram muito
poucos, ou quase nulos, e que traziam muitos riscos.
Estes contractos, publicados em Julho de 2015, eram para
concessões no mar (“offshore”). Mas, em Setembro, a ENMC publicou dois novos
contratos para o Algarve, desta vez, relativos a concessões em terra, com os
nomes de Tavira e Aljezur.
Se estávamos preocupados com as explorações no mar, quando percebemos
que estes novos contratos vão deixar entrar no Algarve as tecnologias de “fracking”,
então a situação tornou-se muito mais séria, porque se há riscos na exploração
no “offshore”, os riscos que o processo de “fracking” traz são muito maiores e
têm impactos negativos permanentes.
O que é o “fracking” e
quais os perigos desta técnica para as regiões onde ela é utilizada?
“Fracking”, “fraccing” ou “fracing” é uma técnica usada para
libertar gás natural ou outras substâncias para a extração e utilização
econômica.
O fraturamento hidráulico ou “hydraulic fracturing” é a
propagação de fraturas numa camada de rocha por um fluido pressurizado. Algumas
fraturas hidráulicas formam-se naturalmente e podem criar canais com petróleo
ou gás que vêm de reservatórios de rochas.
Para fragmentar a rocha são usados tubos que contém água e
químicos que fazem pressão sobre a rocha até quebrarem ou fraturarem a rocha. É
como um mini terremoto. Pela porosidade, injeta-se também areia em quantidade
suficiente para manter o canal aberto e permitir a condução do gás. O “fracturing”
pode provocar impactos ambientais sérios, com prejuízo para a saúde humana pela
contaminação dos canais subterrâneos e por causar danos na qualidade do ar
porque provoca a migração de gases e produtos químicos para a superfície.
Na Europa o “fracking” está proibido em alguns países e nos
EUA há um intenso debate cercando a exploração por “fracking” devido aos danos
já causados.
Este tipo de extração agride gravemente o meio ambiente por
se tratar de um processo que consiste na perfuração e injeção de fluídos
químicos no solo para elevar a pressão, fazendo com que haja fratura das rochas
e a liberação do gás natural. Nos fluídos usados existem cerca de 600 produtos
tóxicos, incluindo agentes cancerígenos. Cada poço pode ser fraturado até 12
vezes e são necessários, de 400 a 600 caminhões tanque de água, para cada
operação. O fluido que é usado é deixado a céu aberto para evaporar, tornando o
ar contaminado e contribuindo para o surgimento de chuvas ácidas.
Durante o processo, as águas subterrâneas próximas que são
usadas para abastecer as cidades da região, também podem ficar poluídas. Houve
mais de 14 mil casos de contaminação próximos a áreas de perfuração, já
confirmados.
A exploração do gás é muito comum nos EUA, onde existem mais
de 500 mil poços ativos. As toxinas que vazam durante o processo estão a causar
a morte de diversas espécies aquáticas, pois prejudicam a qualidade da água,
tornam-na mais ácida, o que provoca graves lesões nos peixes.
Este processo de extração está sendo fortemente questionado
por um grupo de ambientalistas e pela sociedade civil que querem a suspensão
imediata desta prática. Um estudo publicado recentemente afirma que o “fracking”
pode estar ligado à presença de terremotos. Conforme uma das nossas pesquisas,
pelo menos 109 terremotos foram registrados no estado de Ohio (EUA), num
período de 14 meses. Os fenómenos teriam começado após 13 dias do início das
fraturas hidráulicas na região.
Neste momento a ASMAA já tem testemunhos de 16974 pessoas,
dos Estados Unidos, relativos aos impactos negativos do “fracking” nas suas
vidas.
Como funciona uma plataforma de
petróleo e quais os perigos para a costa algarvia se aqui se instalarem
plataformas de petróleo?
Existem dois tipos principais de
plataformas de petróleo no mar: as de perfuração e as de produção. As de
perfuração servem para encontrar petróleo em poços ainda não explorados e
inicia-se com uma série de pesquisas geológicas e geofísicas que localizam
bacias promissoras e analisam os melhores pontos para as perfurar.
As plataformas de produção aparecem quando um poço já foi
descoberto e está pronto para ser explorado. São elas que efetivamente extraem
o petróleo localizado no fundo do mar, levando-o à superfície, onde este é
separado de outros compostos, como água e gás.
Dependendo da profundidade em que se encontra o poço, podem
ser construídos dois tipos de plataforma de produção: as fixas e as flutuantes
(chamadas de semi-submersíveis).
As fixas são instaladas em águas rasas (até 180 metros) e
ficam ligadas ao subsolo oceânico por um grande "pilar".
As flutuantes possuem cascos como os de um navio e servem
para explorar poços que se localizam em lugares muito profundos.
Os danos, vou referir por áreas específicas:
Relativamente à natureza do Algarve, o ambiente marinho desta
região inclui muitos ecossistemas únicos e frágeis, é o lar de muitas espécies,
incluindo aves marinhas, baleias e golfinhos entre elas. Um desastre de petróleo
ou gás vai deixar a flora e a fauna marinha totalmente vulneráveis e até
destruídas pelos efeitos tóxicos.
A pesca comercial é um dos nossos mecanismos económicos que
precisa de ser preservado e a pesca desportiva é uma das atividades mais
populares na região. Um desastre de petróleo ou de gás no mar irá impactar
diretamente nas nossas indústrias de pesca, resultando em perdas de valiosos
recursos e também de muitos postos de trabalho.
As zonas costeiras que estão ainda imaculadas, onde ainda
está presente a vida selvagem, atrai dezenas de milhares de turistas por ano,
injetando um impulso económico para a região. O perigo de um desastre de
petróleo terá um papel negativo na decisão dos turistas para visitarem o
Algarve.
Esta região oferece oportunidades sem paralelo para desportos
marítimos e atividades de aventura, como o “surf”, caiaque, “windsurf”, “jet
ski”, mergulho e passeios de barco, entre outros. Um desastre de petróleo ou de
gás no mar, invariavelmente vai ter um impacto negativo nas muitas empresas que
prestam estes servidos e para todas as organizações e indivíduos que gostam da
praia, do mar e do sol que caracterizam o Algarve.
Os bens e recursos naturais do Algarve devem ser protegidos,
e não, vendidos para serem explorados por empresas estrangeiras. Não podemos
expô-los ao perigo de serem destruídos e daí resultar a perca da nossa
sustentabilidade, só por causa da exploração do petróleo no mar Algarvio sem
medidas de segurança adequadas e asseguradas.
Quanto ao clima, que também tanto o caracteriza o Algarve, os
impactos climáticos devido a exploração de petróleo e gás são desastrosos.
Portugal deve investir em soluções de energia limpa e
ecológica em vez de investir na extração das últimas gotas de petróleo dos
confins da terra e do mar. Devemos ser pioneiros na área climática, e não,
"maníacos" dos fósseis.
O modo de vida na zona costeira do Algarve está em perigo.
Esta é uma parte fundamental do “viver no Algarve” e, sejamos nós algarvios ou tenhamos
decidido viver aqui, temos a responsabilidade de proteger a costa algarvia, não
só para nós próprios e para as nossas famílias, mas também para todos os
visitantes e turistas, assim como temos o dever de pensar no bem-estar e na
sustentabilidade das futuras gerações.